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Um olhar Pós-Contemporâneo à Educação Infantil Montessori no Brasil.

Talita de Almeida


O Método Montessori chega ao Brasil de formas diferentes há mais de 50 anos, criando duas linhas de metodologia: Lubienska, sistematizada por Lubienska de Lenval, aluna francesa de Maria Montessori, e Montessori, implementada por Piper de Lourenço Borges e outras duas brasileiras que frequentaram o último curso realizado pela Dra. Maria Montessori em Perugia, em 1950.


A metodologia Lubienska foi disseminada e adotada em todo o Brasil, majoritariamente por escolas católicas, a partir de São Paulo.


A metodologia Montessori, inicialmente, foi praticada no Rio de Janeiro, na Escola Experimental Montessori, criada por Piper Borges, que a instituiu em 1950 e presidiu a AMB – Associação Montessori do Brasil, primeira associação de educadores montessorianos legalmente constituída no Brasil. Devido a uma grave doença da presidente, a AMB teve sua ação paralisada e finalmente encerrada, assim como a pequena escola.


Como Mario M. Montessori desejava que o Brasil e a América Latina tivessem um desempenho próximo às raízes italianas, em 1974, foi criada, no Rio de Janeiro, a ABEM - Associação Brasileira de Educação Montessoriana- presidida por Talita de Almeida, visando concretizar e expandir os ideais e a prática de Maria Montessori neste país tão pleno de diversidades culturais.


Neste longo período, cursos foram criados para dar fundamento às práticas pedagógicas das escolas, que, pouco a pouco, se disseminavam pelo país. O foco foi quase sempre na Educação Infantil, de 3 a 6 anos, com excelentes resultados. Hoje, o foco ampliou-se, incluindo o Nido, completando assim o primeiro plano de desenvolvimento e reiniciando a primeira fase do Ensino Fundamental I (séries iniciais – 6 a 9 anos), já vivenciada por muitos anos no Colégio Constructor Sui – Campus Internacional Montessori - que a estendeu até os 15 anos (Fundamental II, séries finais), mesmo dentro de seu Projeto de Inclusão. Outras experiências foram realizadas no Colégio Santa Úrsula do Rio de Janeiro e também no Colégio Maria Montessori de Campo Grande, Mato Grosso do Sul, que permanece com Laboratórios e ensino o mais personalizado possível. O Colégio Santa Úrsula de Ribeirão Preto/SP, recria seus ambientes do NIDO à 5ª série, visando uma escola de referência no Brasil. O mesmo acontece com muitas das escolas já reconhecidas e as novas que pouco a pouco vão surgindo, sempre buscando implementar e vivenciar o PADRÃO MONTESSORI.


Em nível de Brasil, a perspectiva de oferecer Educação Montessori de 12 a 15 anos pode vir a ser uma realidade em um futuro breve devido ao interesse das escolas em dar coerência, continuidade, a seus projetos político-pedagógicos e usufruir dos resultados concretos apresentados pelos alunos após o longo percurso escolar: conhecimento prático e criativo, idoneidade, responsabilidade, respeito por si mesmo e pelos demais, entre outras qualidades humanas, mesmo superando dificuldades.

A primeira grande colaboração latino-americana deu-se com a vinda ao Brasil de Aida Larraguibel di Parodi, que presidiu os Congressos brasileiros de 1974 e 1983, trazendo-nos sua experiência de vida junto a Maria Montessori, inclusive tendo colaborado com os Montessori em seu exílio na Índia, durante a 2ª Guerra Mundial. Presentes aos Congressos de 1983 e 1984, Lidia Celi Panzerani e Luciano Mazzetti da Itália trouxeram maior fundamentação e vigor ao movimento que, nesta época, já envolvia todo o continente, inclusive outros países da América do Sul. Phil Gang, dos Estados Unidos, também trouxe sua contribuição inovadora à Educação Cósmica, assim como Olga Dantus do México.


Os contatos com Carolina Gomez del Vale, Elena Young e Ellinor Barentim, do Chile; Alicia Renton, Celma Perry e Betsy Coe, dos Estados Unidos; Marcela Hio, da Costa Rica; Olga Dantus, do México e o Consejo Interamericano Montessori (ex Comitê Hispano Montessori) deram grande apoio e mesmo impulso às iniciativas brasileiras, hoje estruturadas em três vertentes metodológicas: Montessori italiano, Montessori norte americano e Lubienska de Lenval, responsáveis, atualmente, por cinco diferentes instituições de capacitação de professores (ABEM, Centro de Estudos Montessori e Centro de Treinamento Montessori do Rio de Janeiro, o de São Paulo, Colégio Menino Jesus de Santa Catarina,). A Associação Montessori da Bahia integra, hoje, sete escolas, que buscam, em conjunto, uma prática montessoriana pós-contemporânea, utilizando o melhor de suas raízes culturais. Assim, as capacitações vão atendendo às

necessidades de cada região, evitando grandes deslocamentos.


Foram realizados, nesses últimos três anos, pela ABEM, Associação Montessori da Bahia integradas e instituições de nível superior, cursos de pós-graduação Montessori, já com inscrições abertas para 2015.


Em 2003, durante 3º Encontro de Líderes Latinoamericanos e desejando criar laços institucionais mais profundos, Pietro De Sanctis, presidente da ONM- Opera Nazionale Montessori, de Roma e representantes oficiais de Chiaravalle e Monte San Vito, inauguraram uma classe modelo numa escola pública de São Gonçalo, região pobre do Estado do Rio de Janeiro – CIEP Zuzu Angel. A classe, montada pela ABEM, a Creche Escola Smirna e a Escola PETRA em convênio com o CIEP, funcionou durante quatro anos com total êxito. Hoje, existem duas experiências marcantes no campo da educação pública no Brasil: a primeira, realizada por Adriana Lessa Dias, pós-graduada, que mantém duas classes montessorianas numa escola pública na cidade de Capão da Canoa, no Rio Grande do Sul, apoiada pela direção e pelos próprios pais da escola, fazendo com que todos admirem a harmonia e fluidez que ocorre naquele ambiente, tão integrado ao restante da escola. A segunda, é vivida em escolas vinculadas à Prefeitura de Camaquã, também no Rio Grande do Sul, que atende a cerca de 800 crianças de 1 a 5 anos, com 60 profissionais envolvidos e mais de 150 capacitados num trabalho também inovador e exemplar para a realidade brasileira.


E como será a herança de Maria Montessori para o século XXI, já iniciado com tantos conflitos mundiais e tanta perda de valores morais, éticos, humanos? Como viver o Montessori neste Brasil continental, de múltiplas culturas e imensas diferenças sociais?


O foco é de cada vez mais aproximar as escolas montessorianas, de pequeno, médio ou grande porte, entre si, para que se fortaleçam na própria essência da filosofia e dos princípios científicos que Maria Montessori deixou como legado, pois compreende-se que há uma profunda diferença entre ser um técnico montessoriano e ser um mestre montessoriano. Esta diferença dá-se a partir da formação inicial do profissional de uma escola ou instituição educativa e percebe-se na maneira como ele entende a importância da Educação e de como atua no espaço pedagógico, com sua equipe de trabalho, e de como vai interagir com as famílias que integram a comunidade

educativa, cujos valores estão interligados à história e à cultura local.

A Educação Montessori é essencialmente formativa e não somente conteudista. É a aprendizagem de como ser melhor, viver melhor e compreender melhor a vida através do conhecimento, da cultura, da arte e da natureza, tanto humana como planetária.

Para lidar com a natureza humana, isto é, para compartilhar com o mestre interno, referido por Maria Montessori, é necessário que o adulto creia, em primeiro lugar, que também possui um mestre interno, para poder crer no mestre de cada criança e de cada jovem com o qual vai experienciar a Educação Montessori.


A alma montessoriana está alinhada à consciência de uma Educação Cósmica, onde a rede de mestria forma a base desta metodologia. Portanto, é necessário ter como espinha dorsal da construção do conhecimento a Educação Cósmica onde tempo, espaço, natureza e cultura, saídos deste todo conceitual, tecem-se, entremeiam-se, intercomplementam-se, sendo a base e o todo dos conteúdos, como uma grande respiração, fazendo com que a criança e o jovem possam realmente usar o conhecimento prático para ler, interpretar, reverenciar a vida, conduzir seu desenvolvimento e sua preservação pessoal, social, global, visando olhar a si mesmo e ao outro com cuidado e reverência, pois ambos, neste simples olhar, simbolizam toda a humanidade.


Assim sendo, todo o percurso pedagógico montessoriano exige uma profunda reflexão e estabelece a necessidade de uma vida prática solidária em todos os níveis de desenvolvimento e evolução de nossas crianças e jovens, aperfeiçoando cada vez mais sua consciência do que Maria Montessori buscou em seus postulados, um conhecimento que pode e deve ser trabalhado no dia a dia a partir do tripé: educador especializado + ambiente preparado + material de desenvolvimento.


Maria Montessori sugere a PSICODIDÁTICA como a melhor forma de aprendizagem do conhecimento formalizado pelo Homem, pois é o estímulo externo que mobiliza internamente as estruturas psíquicas, decorrente de uma ação sobre o real, gerada por uma automotivação para o conhecer, alimentando a alma e impulsionando o desenvolvimento das estruturas lógicas e físicas, de forma mais consciente, autônoma e mobilizadora.


Psico significa alento, sopro de vida, alma, isto é motivar o interesse manifesto do outro. Psiquismo significa construção, estruturação das necessidades internas.


Didática significa arte de ensinar e de aprender ensinando.


Psicodidática pode significar apreender e construir aquilo que dá sentido à vida, isto é vivenciar um programa de ensino baseado nas estruturas psíquicas do ser em formação, a partir do desejo de conhecer, da compreensão lógica apreendida, da aplicação prática do conhecimento e do estímulo à criatividade.


O Ambiente Preparado, quer escolar, social ou familiar, proporciona à criança e ao jovem, uma visualização e leitura global de um espaço, que permite observar as relações, das mais simples às mais complexas, que constituem o mundo em que se vive. A ordem cósmica está refletida na ordem natural do espaço de vida e a ordem no conhecimento, segundo sua complexidade, permite uma interdisciplinaridade, reforçando ou concretizando o conceito de mundo. Uma mente e um corpo ordenados permitem uma normalização e relações intra e interpessoais mais conscientes, além de uma eficácia na prática do conhecimento adquirido.


O Material de Desenvolvimento expressa-se nos elementos existentes no espaço de vida que a criança ou o jovem deve conquistar segundo a maturidade e possibilidades oferecidas no ambiente preparado. O Material de Desenvolvimento Montessori, rico em seu design e força simbólica, visando concretizar a prática, permite que o mestre interno ultrapasse o simples conhecimento formal para um despertar de percepções mais profundas, de um processo de esquemas mentais e corporais mais complexos, descoberta de talentos e formas de ultrapassar dificuldades; um despertar que abra caminhos para a vida não só naquele momento, mas até para uma futura experiência profissional formal e não formal.


Enfim, a Educação e a metodologia Montessori ultrapassam o momento histórico contemporâneo para a necessidade, hoje, de ser uma formação do profissional montessoriano mais consciente da profundidade desta Educação e de sua Pedagogia para oferecer à criança e ao jovem, que passa pelo processo, uma Educação pós-contemporânea construída na verdade, ou seja uma Educação que vislumbre as futuras perspectivas de vida no Planeta Terra e a possibilidade de uma ascensão espiritual da humanidade.


Para isso, torna-se necessário que os cursos de formação e as supervisões das escolas Montessorianas voltem seu olhar para a profundidade do que Maria Montessori queria atingir: uma ciência humana em constante evolução, um ambiente que leve ao encantamento pela vida, um conteúdo que perpasse passado, presente e futuro, dando sentido a cada indivíduo do “por que estar vivendo”, entendendo cada um como ser único e com missão e aprendizagem diferenciadas.


O Método ou Pedagogia Montessori é hoje reconhecido pelas ciências mais avançadas como a forma mais multidimensional de Educação. É necessário, portanto, reler a Dra. Montessori sob a nova abrangência das ciências de vanguarda e compreender que as crianças e jovens que estão hoje no planeta são diferenciados e necessitam ter espaço para vivenciar a consciência do que são e do que lhes cabe realizar.


O educador do presente não pode ficar no passado de sua formação, engessando o Montessori em programas anuais, bimestrais, diários e fictícios controles, discutindo o óbvio e não se debruçando para as necessidades que o Planeta põe diante de nossos olhos, de nossos ouvidos, de nossas realidades, diante do que a humanidade necessita, diante do que as crianças e os jovens de hoje estão solicitando para um possível amanhã.


Se Maria Montessori pudesse estar aqui presente hoje, neste encontro, provavelmente

estaria nos dizendo:


É urgente viver o Montessori em sua filosofia e princípios!


É urgente reestudar a simbologia, o design e a geometria dos materiais montessorianos!


É imprescindível conhecer os objetivos diretos e indiretos dos materiais de desenvolvimento para domínio, intercomplementaridade e generalização do conceito!


É urgente ter uma real consciência de que as crianças e os jovens de hoje têm características diferenciadas, condizentes com a transformação que o Planeta está passando!


É urgente que circule a energia do conhecimento profundo, mas, principalmente, a de um impulso de amor universal!


É urgente que sejamos realmente montessorianos e que o Ego não seja o diretor e regente de poder!


É urgente que nos unamos em prol da Paz, da Ecologia Humana, Social e Ambiental por uma vida melhor que ilumine o EU, minimize o EGO, alicerce a maturidade, a lucidez, a coerência, o feeling, o altruísmo, a vontade de aprender sempre!


A herança de Maria Montessori para o século XXI ainda dependerá da conscientização do adulto de que sua verdadeira missão é a de construir o futuro através da criança, do jovem, e que este ser aparentemente tão indefeso precisa desse adulto para conhecer e interpretar o mundo que o circunda. Basta que o adulto compreenda bem o seu papel coadjuvante e proporcione os meios para este longo processo de desenvolvimento, principalmente no primeiro plano, isto é, de zero a seis anos. A aprendizagem não depende de riqueza, mas de sabedoria. E o século XXI já iniciado com tantas perspectivas, após 15 anos, nos pergunta: Com esta realidade, como realizar a máxima deste período: “Ajuda-me agir por mim mesmo”.

Aprender é um processo de vida!

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